Patologia sistemática
Nos últimos anos um fenômeno desagradável tem sido observado em termos de educação em nosso país, isto é, os alunos têm obtido resultados nada satisfatórios em avaliações internacionais como o Pisa (programa internacional de avaliação de estudantes). A avaliação aqui usada como exemplo tem a finalidade de examinar o desempenho dos alunos no que diz respeito a linguagens, matemática e ciências. Cabe também salientar que a última edição da prova contou com a avaliação do pensamento criativo, o que demonstrou mais uma vez a inferioridade do Brasil se comparado com outros países do mundo.
Para o leitor compreender um pouco melhor, o Pisa define pensamento criativo como “a competência para se envolver produtivamente na geração, avaliação e melhoria de ideias que resultem em soluções originais e eficazes, avanços no conhecimento e expressões impactantes da imaginação”. Antes de ir mais a fundo nessas questões, quero mais uma vez retratar o cenário do nosso país e qual tem sido a principal base da formação do pensamento dos nossos jovens.
O poder da influência
Já não é surpresa para ninguém que num mundo dominado pelas redes sociais, tenha se tornado comum ouvir muitos jovens dizendo que não desejam ser engenheiros, advogados, médicos, administradores, físicos, professores e diversas outras profissões que fizeram que nosso país se tornasse o que é hoje. Com isso não quero dizer que nossos jovens devam ser pressionados e obrigados a seguirem carreira em ofícios que consideramos os certos, os mais promissores e que carregam consigo maiores dosagens de reconhecimento social. Todos são livres para escolherem seu próprio caminho. O problema aqui mencionado é que as referências de influência atualmente se encontram um pouco distorcidas.
A mentalidade da geração atual tem sido completamente reformulada, de modo que os jovens agora desejam ser influenciadores, youtubers, tiktokers, e toda sorte de atividades remuneradas que envolvam a internet. Além de passarem a maioria de seus dias imersos na sua realidade digital como forma de entretenimento, de uns tempos para cá, chegaram à conclusão que atingirão sucesso vertiginosamente mais elevado se dedicarem suas vidas às mídias sociais e afins.
Sabendo disto, como poderíamos convencer um jovem que estudar é um bom caminho, sendo que com dois cliques o mesmo verá seu influenciador favorito ostentando um estilo de vida na casa dos milhões? Impossível. Sabemos também que nem de longe as razões acima são o único motivo para o péssimo desempenho do Brasil no ranking mundial. Todo bom e velho brasileiro com o mínimo de percepção da realidade objetiva desse país sabe muito bem que o ensino básico encontra-se sucateado há décadas, mas não quero entrar nesses méritos.
O empreendedorismo é a solução?
Uma narrativa que tem ganhado bastante notoriedade é a que diz que diplomas universitários não valem mais a pena, que o mercado está saturado, e que empreender é a grande chave para o sucesso. Investir longos anos para obter conhecimento técnico e acadêmico? Esqueça! A nova onda das redes sociais é o empreendedorismo, receitas de bolo inovadoras que te levarão do zero ao milhão em poucos meses. Escola e universidade é para fracassados, eles dirão. Apesar do descrito anteriormente, preciso acrescentar aqui um pouco de justiça e defender o ponto de vista de quem afirma tal coisa. De fato, as escolas e universidades encontram-se sucateadas e em agressivo declínio, fora toda a questão ideológica por conta da guerra cultural. Também não me parece exagero dizer que na era das graduações à distância, muitas instituições transformaram a educação num mero produto engessado, o foco agora é entregar qualidade mínima que alguém esteja disposto a pagar. Formar verdadeiros intelectuais e pessoas que causarão significativo impacto no avanço social, cultural e tecnológico do país, isso não parece tão importante.
Olhando por esse ponto de vista, pode parecer correto dizer que os defensores do desenvolvimento pessoal artificial e do empreendedorismo estão certos, mas o problema aqui é muito mais profundo. De um lado, uma quantidade absurda de novos profissionais se formando nas universidades, mas sem sucesso na hora de conseguir um emprego em sua área. De outro lado, um número massivo de empresas que declaram falência depois de menos de dois anos da abertura, o que prova que empreender também não é a solução última para os problemas do país.
A chave para a questão
Voltemos agora para o tema central desse texto, o fracasso do Brasil no que diz respeito à educação. Gostaria agora de explicar os critérios de avaliação brevemente. Em primeiro lugar, temos expressão escrita, que visa aferir a capacidade de expressar ideias e imaginação através da linguagem escrita. Em segundo, expressão visual, que avalia os alunos quanto a capacidade de expressar seus pensamentos através das mais diversas mídias. Terceiro, resolução de problemas sociais, que determina que os alunos elaborem possíveis sugestões para sanar as mais diversas questões na sociedade. E por último, resolução de problemas científicos, que como o próprio nome expressa, avalia os alunos quanto a capacidade de criar novos métodos para verificar hipóteses científicas, idealizar novas tecnologias e invenções que atendam novas necessidades.
Infelizmente o Brasil tem se colocado nas últimas posições do ranking, enquanto a mesma é encabeçada por Singapura, Coreia do Sul, Canadá, Austrália e Nova Zelândia segundo a Revista Exame. Sabendo de todas essas questões, fica um pouco mais fácil compreender que os problemas do nosso país são ainda mais profundos, isto é, os adolescentes com idade entre quinze e dezesseis anos (idades médias dos alunos submetidos ao teste) tem suas mentes moldadas pelo conteúdo ao qual foram expostos cumulativamente até então. Como consequência disto, serão ou não adultos com notória relevância na sociedade. A pergunta crítica é, “A que tipo de conteúdo e estímulos nossos jovens têm sido submetidos?”
Um futuro possível?
Não se trata única e exclusivamente da obtenção de um diploma e posteriormente um emprego numa empresa sólida que te proporcionará conforto para o resto da vida, muito menos em apostar no empreendedorismo para fazer altos montantes de dinheiro e viver uma vida luxuosa. A questão central aqui é desenvolver a capacidade de ação humana, como, por exemplo, formar pessoas capazes de inovar no que diz respeito a tecnologia, artistas capazes de registrarem das mais diversas formas a memória do nosso tempo. Formar pessoas voltadas para o registro de nossa história por meio de grandes obras que refletem com maestria a trajetória de nosso país. Que nossas terras sejam geridas por pessoas que definitivamente compreendam refinadamente técnicas de números, administração e economia, com alta compreensão do cenário social, cultural, e afins. O mecanismo que move um país para o topo do desenvolvimento humano se baseia na preparação sistemática e efetiva de jovens que desde cedo têm seus cérebros polidos para exercer com maestria uma vocação descoberta e estimulada desde a mais tenra idade.
Apenas aplicando tais métodos geração após geração nosso país recuperará o tempo perdido e figurará no topo. Avaliando os resultados dos exames resumidamente, a resposta obtenível é que alguns países têm obtido sucesso em semear uma nova geração efetiva e que assumirá as rédeas da nação do ponto onde a geração anterior deixou. Enquanto no Brasil e países com piores resultados, estão todos lidando com o fato que os jovens consideram as ações do passado como um erro e não desejam receber o bastão para avançar com o legado. Ao invés da preocupação com o desenvolvimento e prosperidade de um povo forte e soberano, as preocupações por aqui envolvem majoritariamente questões de sexualidade, identitárias, relacionamentos vazios, fofocas de famosos e toda sorte de superficialidades que causarão um impacto devastador na transição de gerações. Fato é que quando a geração seguinte decide adotar uma postura rebelde e trilhar seu próprio caminho, a sociedade falha em trilhar o caminho do progresso e uma geração é completamente perdida. Os ideólogos do comunismo perceberam isso há muito tempo. Eles vêm aplicando sua metodologia muito bem sistematizada na literatura de seus principais figurões, obtendo então enorme sucesso ao longo dos anos, fazendo com que cada nova geração siga exatamente de onde a geração anterior parou. Perceberam claramente que o tempo de uma vida é muito curto diante do trabalho a ser feito, e para o sólido estabelecimento das bases de uma sociedade não deveria ser diferente.
Ou o Brasil obtém sucesso em semear o melhor nas novas gerações, ou seremos para todo sempre um gigante de joelhos.
